quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Justiça: não há quem não entenda

O STF deve começar a emitir hoje o seu julgamento no mensalão. A principal consequência, não é absurdo sustentar, é o sentimento de justiça ou injustiça que se seguirá ao veredicto. Quando o País parar para assistir à sentença, mais do que o destino individual dos réus
estará em jogo a crença sobre a possibilidade ou não de fazer justiça no Brasil.
O conceito de justiça, entretanto, como é característico dos conceitos realmente fundamentais para a vida humana, desafia definições pelo fato simples de parecer evidente a cada um. Como a liberdade no verso maravilhoso de Cecília Meirelles, também a ideia de justiça é uma palavra que o sonho humano alimenta, e não há ninguém que explique, nem ninguém que não entenda. Mas, dada a importância do processo, aqui é preciso que tudo se explique e se entenda. E que cada ministro explique não apenas seu voto, mas o porquê do voto. O caráter simbólico do julgamento, seu potencial para reafirmar ou desmentir, num instante, séculos de leituras sobre a nossa sociedade, torna essa explicitação absolutamente crucial.
Referências genéricas a interesses de cliente ou do Estado não bastam. Não basta alegar que este ou aquele aspecto técnico obriga à absolvição ou não impede a condenação, que esta ou aquela prova deve ser aceita ou não por razões técnicas. Razões técnicas, como bem intui o cidadão, não são incontroversas e dependem da interpretação que se dá às normas. E tal interpretação se funda em crenças e opções fundamentais. Daí o imperativo de que cada voto afirme com clareza o modo como o julgador valora e articula técnica e fato, procedimento e substância. Em outros termos, é preciso que cada um deles explicite de que maneira entende que se deva produzir a conexão entre Direito e Justiça no Brasil.
Qualquer que seja a decisão do STF, é inevitável que haja frustração, de alguns ou de muitos, natural em sociedades democráticas. O que não é inevitável que ela se traduza em descrença nas instituições. Para impedir a descrença, as absolutas clareza e transparência não apenas quanto ao como se chegou a tal decisão, mas, sobretudo, quanto aos motivos pelos quais se escolheu esse caminho, em detrimento de outros, contribuem mais decisivamente para que haja justiça na sociedade brasileira.

Artigo publicado no jornal Estadão em 15/08/2012, disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,justica-nao-ha--quem-nao-entenda-,916680,0.htm

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