A norma
conjunta (MEC-OAB) que, segundo
noticiado, irá obrigar todos os alunos de direito a estagiarem em
órgãos públicos poderá se mostrar equivocada em sua estratégia e
contraprodutiva em sua implementação.
Equivocada
porque o objetivo pretendido pela nova regulação, conforme se anuncia, é o de
buscar reduzir os altos índices de reprovação no Exame da Ordem. Se este é o
caso, então a obrigatoriedade desse estágio em particular não apenas ajuda em
nada, como arrisca piorar as coisas, mascarando as verdadeiras raízes do
problema.
A
importância da prática no ensino jurídico não está vinculada a um simples
fazer, a um tarefismo não-planejado (que, de resto, já acontece amiúde), mas a
propostas pedagógicas capazes de produzir a construção crítica do saber a
partir da prática. Propostas pedagógicas consistentes, entretanto, não nascem
do dia para a noite, não se constroem por decreto, nem se legitimam de cima
para baixo.
A
prática, por si só, não qualifica – a não ser, talvez, para algumas pequenas
rotinas da própria prática. Não fosse assim, os milhares de estudantes que já
estagiam em escritórios e órgãos públicos, desde os primeiro momentos da
faculdade, passariam sem dificuldades no Exame da Ordem, o que não é o caso.
Muitas vezes é o inverso o que ocorre – alunos mais voltados à investigação
acadêmica obtêm sucesso após um período relativamente breve de preparação para
a prova.
Isto para
não falar daqueles muitos alunos que irão se dedicar a outras profissões jurídicas
– as faculdades de Direito não são faculdades de advogados, é sempre bom
lembrar. O objetivo de melhorar o desempenho no exame da Ordem é legítimo, mas
redutor para quem quer pensar a fundo as questões do ensino jurídico
brasileiro. O país precisa de advogados – mas não só deles – e a regulação
estatal deve levar isto em conta.
Mas além
de equivocada, esta norma anunciada pode ser tornar contraprodutiva em sua
implementação. A obrigatoriedade faz tabula rasa das diferenças e necessidades
regionais e atropela iniciativas locais frequentemente muito mais eficientes
além de potencialmente gerar, como já
apontou o professor Joaquim Falcão, custos elevados e desnecessários
aos cofres públicos. Este inútil caráter obrigatório – porque o estágio não
poderia ser recomendado, mas facultativo ?– cria enormes embaraços sem ampliar
em nada as possibilidades que pretende gerar.
A
qualificação do ensino para todas as profissões jurídicas no Brasil requer,
menos do que imposição de normas centralizadoras, mais reflexão séria sobre
propostas e filosofias de ensino, mais respeito pluralidade de um país tão rico
em sua diversidade regional, assim como uma leitura do Direito mais ampla
e um debate mais aberto com toda a sociedade.
Artigo publicado no jornal Estadão em 14/03/2013, disponível em http://blogs.estadao.com.br/direito-e-sociedade/o-fetiche-da-pratica-e-o-vezo-da-imposicao/
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